As conquistas das mulheres ocorrem lentamente; já os retrocessos andam a galope
Estadão
Estive recentemente no Centro do Prêmio Nobel da Paz, em Oslo. É o prêmio que Lula deseja. Apoiando Putin, Maduro e sendo tolerante com o grupo terrorista Hamas, vai ser difícil. Na galeria, vi fotos de Kissinger, apesar de ele ter apoiado as ditaduras e torturas na América Latina, e de Aung San, cujo prêmio foi mantido mesmo com acusações de genocídio dos rohingyas em Mianmar. Lula tem, então, direito a sonhar.
Minha ida coincidiu com as comemorações do Dia Internacional da Mulher. Por isso, três nomes me tocaram pela atuação no combate à violência de gênero: os das iranianas Shirin Ebadi (2013) e Narges Mohammadi (2023) e da iraquiana Nadia Murad (2018).
Shirin aparece na foto de cabelos curtos, sem véu. Narges recebeu o prêmio por sua luta contra opressão das mulheres, de dentro da prisão de Evin. Está condenada a 31 anos e 154 chibatadas. Elas comandam o Centro de Defensores dos Direitos Humanos (DHRC), criado por Shirin. No Irã, até a forma de usar o véu é controlada pelo governo, e duas jovens foram assassinadas recentemente por estarem com parte do cabelo à mostra. Nadia é uma sobrevivente de um sequestro do Estado Islâmico e denunciou o uso de violência sexual como arma de guerra.
Os avanços nas conquistas das mulheres ocorrem lentamente, enquanto os retrocessos andam a galope. A ONU levou mais de quatro meses para reconhecer que o Hamas violentou e torturou mulheres judias no pogrom de 7/10, mesmo elas tendo sido exibidas como troféus pelas ruas de Gaza. E o Irã preside o Conselho das Mulheres da mesma organização.
Nos EUA, a Suprema Corte mudou em 2022 a jurisprudência sobre aborto estabelecida por Roe vs Wade quase 50 anos antes. No Brasil, mulheres vítimas de estupro, inclusive crianças, têm seu direito ao aborto legal questionado pela própria Justiça. Dupla crueldade.
Na Venezuela, uma mulher foi impedida de concorrer nas eleições contra Maduro. Lula a mandou parar de chorar.
As estatísticas de violência sexual no Brasil não param de crescer. O assassinato é o último elo de uma cadeia de abusos de toda sorte cometidos ao longo dos anos. Raros processos chegam até o fim levando à condenação e, quando acontece, em poucos anos estão nas ruas. O caso do goleiro Bruno é simbólico.
Quando eu era jovem, não comemorava o Dia Internacional da Mulher. Se queríamos ser tratadas como iguais, por que um dia especial? Mudei. É dia de lembrar do preconceito, do retrocesso e da violência. Mas é também dia de celebrar e ganhar flores. Batom e calcinha, a gente mesmo compra.
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