Naercio Menezes Filho, professor do Insper, diz que a redução da pobreza e miséria só vai continuar se melhorar a eficiência da economia e a qualidade da educação
Globo
O professor do Insper e especialista em mercado de trabalho e educação, Naercio Menezes Filho, diz que o país está indo melhor na área social, mas que somente o aumento da produtividade vai garantir que os indicadores como pobreza, miséria, estudo e trabalho de jovens continuem melhorando.
Nesta quarta-feira, o IBGE divulgou a Síntese dos Indicadores Sociais, que mostrou a pobreza e a miséria no menor patamar histórico.
O que levou à essa queda na miséria e pobreza?
Os resultados são muito bons. O principal é a pobreza e a miséria terem caído ao menor nível da série. São os indicadores sociais mais importantes, principalmente a miséria, situação na qual as pessoas não têm condições de comprarem alimentos.
O país está indo melhor na área social. Essa melhora era esperada. Programas sociais com valor elevado parecem ter sido suficientes para eliminar a pobreza extrema em grande parte do Brasil. E, além disso, o mercado de trabalho está bombando, com a menor taxa de desemprego da série. É previsível ter melhora nas condições de vida da população. Isso se reflete na redução da pobreza, via mercado de trabalho.
Pelo lado social, o Brasil melhorou muito nos últimos anos, transferência de renda, aposentadorias, seguro-desemprego. O que falta é aumentar a produtividade, sem isso é difícil sustentar esse ciclo. Aquecimento do mercado de trabalho bate inflação, o que provoca o aumento de taxa de juros que vai afetar mais cedo ou mais tarde o mercado de trabalho.
Quais são as perspectivas para esses indicadores?
Vai ficar meio estável, não dá para sustentar essa melhora no mercado de trabalho por muito tempo. Estamos quase em pleno emprego. Não dá para aumentar as transferências (como Bolsa Família). E não conseguimos aumentar a produtividade. Há quatro décadas, ela está estagnada.
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O que precisa ser feito para aumentar a produtividade?
Precisa abrir a economia, diminuir as tarifas de importação, melhorar a eficiência governamental, as empresas inovarem mais e ter os resultados da Reforma Tributária.
Essa foi uma coisa positiva que pode contribuir para o aumento da produtividade, mas os efeitos vão vir de forma muito devagar nos próximos dez anos. A qualidade da educação é muito baixa. Alunos brasileiros não sabem fazer contas básicas aos 9 anos.
A desigualdade ficou estável, mesmo com a queda da pobreza. Qual a explicação?
Difícil entender essa estabilidade, pode estar ligada a outros componentes da renda como lucros, juros e aluguéis, porque, no mercado de trabalho, o salário dos menos qualificados tem subido mais.
Diminuiu o número de jovens que não estuda nem trabalha. Deve continuar reduzindo nos próximos anos?
Temos o boom, o ápice do mercado de trabalho, as oportunidades para os jovens melhoraram. Mas esse é um problema estrutural entre os mais jovens, especialmente os menos escolarizados. Eles não têm perspectiva de trabalho formal, de concluir os estudos e ir para faculdade. A qualidade do ensino público é muito baixa, não houve investimento na primeira infância. Vão para o emprego informal, entregando alimentação, depois caem no desemprego e na inatividade. Numa conjuntura pior, esse número de nem-nem volta a aumentar.
A parcela de nem-nem subiu entre os mais pobres, mesmo com a melhora no mercado de trabalho.
Enquanto não melhorar a qualidade da educação, esses 20% e 25% dos jovens, principalmente os mais pobres, vão se manter. Sem isso, não vai consertar. Pelo menos estão trabalhando mais, diminuindo a pobreza.
No lado social, ninguém mais passa fome, há estado de bem-estar muito bom, muito organizado, mas não tem produtividade, não tem concorrência nas empresas, o setor público é ineficiente. Sem isso, não tem crescimento de longo prazo e não vai melhorar a vida dos mais pobres. O Brasil é isso nos últimos 30 anos.
Link da publicação: https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2024/12/05/sem-aumentar-a-produtividade-nao-tem-como-melhorar-a-vida-dos-mais-pobres-diz-especialista-em-trabalho.ghtml
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